segunda-feira, 11 de julho de 2011

Trânsito livre entre Arenales, o aniversário da porca e unhas sujas

Trânsito livre entre Arenales, o aniversário da porca e unhas sujas

por Viegas Fernandes da Costa

O primeiro final de semana do 24° FITUB contou com a apresentação de cinco espetáculos, quatro deles integrando as mostras universitárias, e “Amálgama”, que integra a mostra blumenauense. Na Mostra Universitária Nacional subiram ao palco os Alunos do Projeto de Diplomação da UnB (DF), com a peça “A porca faz anos”, e a Cia. SeisAcessos da Unicamp (SP), com o espetáculo de improvisação “Trânsito livre”. Já pela Mostra Universitária Ibero-Americana subiram ao palco o Grupo Arenales Cooperativa Teatral do IUNA (Argentina), com a peça “Arenales, um pueblo bajo el mar”; e a Compañia La Gorda da Universidad Mayor (Chile), com o espetáculo “Uñas sucias”.
"Trânsito livre" (Foto: Daniel Zimmermann)
 Com bom público, os quatro espetáculos, entretanto, não chegaram a entusiasmar as plateias, e o destaque ficou mesmo com o grupo argentino, que apresentou “Arenales” na tarde de sábado. Já a maior frustração pode ser atribuída ao espetáculo de improvisação “Trânsito livre”, na noite de domingo. Neste os atores pareciam não estar preparados para a natureza das perguntas realizadas pelo público –“Que pergunta eu faço?”; “O que acontece quando as perguntas acabam?”; “O que é pior: pensar e falar, ou pensar e calar?” – , e sobre as quais deveriam desenvolver os números, o que resultou em um espetáculo de dança pobre em sentidos e conteúdos, com um desenvolvimento arrastado e pouca criatividade.
"Arenales, um pueblo bajo el mar" (Foto: Daniel Zimmermann)
 "Arenales, um pueblo bajo el mar”, com texto de Sergio Sebater e Ana Rodriguez Arana e direção de Sergio Sebater, conta a história de um povoado costeiro arrasado por um tsunami. Lembrando um pouco a proposta do filme “Nós que aqui estamos, por vós esperamos”, de Marcelo Masagão, a peça procura apresentar uma breve biografia das pessoas que moravam e sonhavam em Arenales, mais de uma dezena de personagens que se desdobram sobre o palco, e que desaparecem sob as monstruosas vagas do mar. A peça tem como mote um monumento que recorda as vítimas da catástrofe natural. Deste monumento desprendem-se os personagens para um recuo no passado e na memória, e estes mesmos personagens – numa mistura de musical e teatro narrativo – desfilam e narram suas histórias para o público presente ao teatro. Por fim, antes de retornarem ao frio mármore do monumento, lembram que as tragédias podem ser naturais, como o tsunami em Arenales, mas também provocadas pela ação humana, como foi o caso da cruenta ditadura militar argentina, que sequestrou, torturou e assassinou aproximadamente 30 mil pessoas (algumas destas foram lançadas vivas ao mar, jogadas de aviões militares), e levou ao exílio mais de 2 milhões de cidadãos. Assim como o tsunami que recentemente soubemos destruir o Japão, a ditadura militar argentina sepultou sob a lápide do mar histórias e sonhos humanos que ainda ecoam seu horror.
Chama a atenção no espetáculo do grupo argentino toda sua estética poética, tanto na força da narrativa quanto nos movimentos dos atores. A figura do monumento humano que se movimenta alternando a tranquilidade fria do mármore e o horror da morte trágica, é sublime. Também o desempenho dos músicos em palco é digno de nota. Deixa a desejar, entretanto, a forma como dramaturgos e diretor exploram as biografias dos personagens. Talvez por serem muitos, e pequeno o tempo da peça, falta profundidade naquilo que dizem de si os moradores de Arenales. Por outro lado, a dramaturgia acerta quando relaciona o tsunami à ditadura militar, conseguindo universalizar a história prosaica de um pequeno povoado e seus habitantes anônimos. Assim, “Arenales, um pueblo bajo el mar” está vivo e dialogando conosco.
Ainda na noite de sábado apresentaram-se, no palco do grande auditório do Teatro Carlos Gomes, os alunos da Universidade de Brasília com o espetáculo “A porca faz anos!”. Com direção de Felícia Johansson e autoria coletiva do próprio grupo, a comédia propõe-se na lógica do Teatro de Revista, e mistura música, dança e teatro. Ambientado em Brasília, faz uma sátira burlesca das instituições e políticos brasileiros, parodiando discursos e personagens reais e fazendo referências diretas a fatos contemporâneos noticiados pela imprensa brasileira.
"A porca faz anos!" (Foto: Daniel Zimmermann)
Apesar de ser divertida e apresentar acompanhamento musical e trabalho vocal excepcionais, e números de dança admiráveis (incluindo-se uma surpreendente apresentação de dança de rua ), “A porca faz anos!” decepciona justamente naquilo que deveria ser seu ponto alto: a sátira política. Exagerando nos estereótipos e simplificando demasiadamente a realidade política brasileira, a peça acaba por carecer de senso crítico, caindo no senso-comum e perdendo a oportunidade de apresentar uma crítica mais inteligente e contundente (o que parecia ser a intenção inicial do espetáculo). Também a excessiva duração da peça acabou por torná-la repetitiva e cansativa. Talvez por se tratar de uma dramaturgia construída coletivamente, mas “A porca faz anos!” parece ser uma pura reunião de bons números e esquetes que não conseguem, entretanto, atingir um bom resultado quando reunidas em seu todo.
Por fim, na tarde de sábado, apresentou-se a Compañia La Gorda, do Chile, com a peça “Uñas sucias”, com texto de Luis Barrales e direção de Carolina Larenas e Alejandro Bradasic. Com um enredo simples e dramaturgia enxuta, “Uñas sucias” conta a história de cinco jovens jogadoras de futebol que integram um pequeno time e almejam chegar à divisão profissional. Ao ficarem presas no vestiário, as cinco moças acabam por fazer aparecer seus conflitos, preconceitos e rivalidades. A peça consiste nos diálogos que as cinco atrizes estabelecem entre si, e o cenário restringe-se a dois bancos de madeira e uma penteadeira.
"Uñas sucias" (Foto: Daniel Zimmermann)
 “Uñas sucias”, apesar de margear temas de debate bastante atual, como a pedofilia e a homossexualidade, não entusiasmou a plateia e teve poucos momentos realmente interessantes.

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