sexta-feira, 16 de julho de 2010

A cena é pública

A cena é pública

por Viegas Fernandes da Costa

Com uma proposta de intervenção urbana, na tarde do dia 13/07 apresentou-se o “Grupo de Teatro de Operações”, da UNIRIO (RJ), com o espetáculo “A cena é pública”, na praça do Teatro Carlos Gomes e seus entornos.
Considerando a alma taciturna, prussiana, de Blumenau, a proposta do grupo carioca chamou a atenção pela forma como os atores ocuparam o espaço da praça e da rua, interferindo no cotidiano das pessoas e tentando promover uma situação de tumulto, capaz de convocar não apenas o público já presente ao Festival de Teatro, mas principalmente os transeuntes tangidos pela rotina, a se mobilizar ao redor das ações dramáticas.
O espetáculo inicia com uma sátira à atual conjuntura política brasileira. A cena inicial apresenta um debate entre os principais candidatos à presidência, coordenado por um Nelson Mandela dessacralizado (o ex-presidiário, como a todo instante é referido) e por um José Sarney preocupado em não ser envenenado pelo público. Quanto aos debatedores, nada têm a dizer, e quando convocados a expor suas propostas e questões, limitam-se a luta corporal com seu adversário, transformando a ágora em ringue. Entretanto, a crítica política inerente ao desenrolar da cena não ultrapassa os limites do senso comum, constituindo-se por demais simplista e limitando-se a reproduzir clichês já absorvidos em nossa sociedade. Vale porém destacar a cena da lavanderia, momento em que bandeiras brasileiras são lavadas no chafariz da praça, e a do enforcamento de José Sarney na fachada do Teatro Carlos Gomes. Esta última, se por um lado gerou um impacto visual interessante (não é comum ver-se um corpo balançando enforcado em um dos principais pontos turísticos da cidade), por outro quedou vazia, afinal, qual o motivo do enforcamento? Da forma como foi representado, o ato extremo do senador constitui-se como suicídio, e não como lapidação pública. Também a crítica à sociedade da informação se fez presente, notadamente quando televisores são destruídos, e houve uma tentativa de problematização das relações entre público e atores. Da mesma forma como o público era convidado a se deslocar constantemente em busca das ações dramáticas, era expulso dos espaços para que estes pudessem servir de arena aos atores. O espetáculo contou ainda com muita pirotécnia (inclusive com o uso de motosserra e a queima de fogos de artifício), movimentação (onde atores ocupam fachadas de prédios públicos e privados no entorno do “Carlos Gomes”) e uso de efeitos sonoros impactantes.
Se compreendido enquanto intervenção urbana, “A cena é pública” teve seus méritos. Conseguiu mobilizar as pessoas e fazer um uso diferenciado do espaço público (apesar da cena final – uma guerra de água entre público e atores – , completamente desnecessária e que afastou muitos daqueles que haviam se aproximado para acompanhar o espetáculo). Porém, se pretendido enquanto teatro de rua, “A cena é pública” fracassou completamente. O uso de efeitos visuais e sonoros impactantes prestou-se a tentar camuflar as deficiências vocais e de representação dos atores, bem como uma dramaturgia extremamente pobre e, em muitos momentos, completamente ausente.
Lamentável, diante das possibilidades que o “Grupo de Teatro Operações” podia ter explorado.

Nota: O espetáculo “A cena é pública” foi apresentado também na manhã do dia 14/07, no pátio do Campus I da Universidade Regional de Blumenau.

Fotos: Daniel Zimmermann / CCM Furb

Um comentário:

  1. movimento, intervenção, abalo, contra movimento comum cotidiano, radicalidade...
    MARAVILHOSO TRABALHO!

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