quinta-feira, 12 de julho de 2012

Estufa

"Estufa"

Viegas Fernandes da Costa

Crédito da Imagem: Daniel Zimmermann
O sentido é a ausência de sentidos. Dadaístas já pensavam assim lá no primeiro quartel do século XX, e outros antes, e outros depois. Se na urbanidade monstruosa onde bilhões de vidas nascidas para desaparecer, esbarram-se na incomensurável solidão de multidão, há esta sensação de crescer sob os limites de uma liberdade controlada, sob um sol que se anuncia sobre um filtro, qual plantas que crescem sob estufas. Ainda assim, há a arte que se pretende anúncio daquilo que julga importante; a arte que se pretende ave, mas rasteja nos limites da técnica e da sacralidade teórica; o ator que se deixa manipular títere sob as mãos de um diretor/deus. Afinal, o que dizemos? Afinal, para que dizer? Afinal, o que representa a arte, o que significa o teatro?
O Coletivo Kerencaferem, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, trouxe à 25ª. Edição do Festival Internacional de Teatro Universitário de Blumenau o espetáculo “Estufa”, sob direção de Nina Balbi e texto do próprio coletivo. Encenado em espaço allternativo (uma sala de aula), “Estufa” construiu uma ação cênica que tinha como objetivo primeiro discutir o estilo de vida nas estruturas urbanas contemporâneas, mas que resultou principalmente em uma espécie de metateatro.
À plateia contorna um cenário que reproduz uma espécie de estufa. Folhas secas cobrem o chão, e plantas pendem do teto. A atmosfera é pesada. Um quadrado sombrio e úmido no qual se desenrola a não-trama. A um dos cantos, uma cadeira na qual um dos personagens (o ancião sábio protagonizado por um ator jovem que propositalmente não faz qualquer esforço para parecer idoso) passará sentado por toda peça. Qual sua função? Não há função.
Crédito da Imagem: Daniel Zimmermann 
Sobre o chão de folhas secas os demais personagens interminavelmente armam uma espécie de piquenique. A toalha, a louça, os talheres. Tudo deve estar exatamente no lugar. Também os próprios personagens/atores necessitam constantemente reafirmar, afinal, os papeis que supostamente representam, em uma espécie de trama dentro da não-trama. Toda esta ordem, entretanto, esbarra na imposição da desordem, porque esta impera, subterraneamente, e aflora na cena, destruída com violência. O primitivo se impõe, a dor em todos os sentidos protagoniza. Ainda se tenta apelar a uma pretensa razão, e uma voz onisciente (o diretor? Deus? os fatos sociais?) que se anuncia pelo telefone, orienta a ação para que esta funcione. Mas a ação não funciona, e qualquer tentativa de ordenamento esbarra no caos. O caos é tudo que passa a existir, interna e externamente.
“Estufa” apresentou uma ótima ambientação cênica e algumas interpretações convincentes, e se seu objetivo, enquanto proposta dramatúrgica, era provocar incômodo e angústia na plateia, conseguiu. Por outro lado, sua linguagem tornou-se por demais cansativa e hermética, distanciando o público e resultando em uma espécie de vazio. Talvez tenha sido justamente esta a intenção da diretora e do grupo; entretanto, cabe questionarmos qual o lugar de um espetáculo como “Estufa” na cena contemporânea. Se, por um lado, esforça-se por anunciar a modernidade absurda que construímos, por outro, esgota-se num experimentalismo já exaustivamente explorado.
Ao final restou a frustração com a própria peça, e a sensação de que o teatro morreu.

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