“As
estrelas são para sempre”
Viegas
Fernandes da Costa
A tentativa de
vivermos um passado que há muito marulha dentro de nós. Personagens em nossa
própria história, de alguma forma universal. Não há geopolítica nos territórios
que atravessam a existência de cada humano. Infância, juventude, maturidade,
velhice: as fronteiras delimitadas nos gestos que nos unem. Na babel da
existência humana, dos muitos traços, das muitas línguas, quando falam nossos
corpos, fazemo-nos inteligíveis.
Motiva-me esta
reflexão a dramaturgia de “As estrelas são para sempre?”, apresentada pelo grupo
“Katharsis” da Universidade de Sorocaba na noite de sexta-feira (a peça abriu a
mostra universitária nacional do 26º Festival Internacional de Teatro
Universitário de Blumenau). Sob a direção de Roberto Gill Camargo, muito mais
do que contar uma história, o espetáculo pretende, por meio do corpo do ator,
uma linguagem universal capaz de promover no público o reconhecimento de si no
outro. Não importa, para este reconhecimento, o idioma em que se anuncia o
personagem. Tampouco importam suas origens nacionais, ou o cenário das suas experiências.
É no gesto mais fundamental, na expressão do riso infantil ou no tremular da
velhice, no rosto crispado ou nos dedos tensos e recurvos de um pé que ainda se
busca apoio, que se constrói o diálogo e o reconhecimento entre personagem e
público.
Em um palco nu,
o espetáculo tem no trabalho de ator sua grande virtude. Isto não significa,
entretanto, que “As estrelas são para sempre?” descuide do restante. Figurino,
iluminação e sonoplastia são impecáveis. A trilha sonora, executada ao vivo por
dois músicos que ocupam o canto direito do palco, com uma grande variedade de
instrumentos musicais, é o brinde de luxo. O trabalho do “Katharsis” é
surpeendente!
São quatro os
atores que representam múltiplos personagens, contracenando principalmente em
duplas, cada qual se expressando em uma língua diferente, ora o francês, ora o
português, inglês, japonês, espanhol ou, ainda, a mais tenra de todas: os
balbucios infantis. O trabalho de preparação de ator é impressionante, mas Andréia
Nhur foi, sem sombra de dúvidas, o grande destaque da peça. A atriz, que assina
também a preparação vocal e corporal do espetáculo, deu vida a nada menos
que nove personagens com identidades
absolutamente distintas, além de interpretar canções do cancioneiro popular. O
ponto alto da sua apresentação foi quando apresentou o personagem “Velho do Bumba-Meu-Boi” em um dos vários
esquetes que costuram a dramaturgia.
Se as estrelas
são para sempre, não o sabemos. Mas certamente por muito tempo ainda
lembraremos da passagem do Katharsis pelo palco do Teatro Carlos Gomes. Um
espetáculo comovente, poético, pronto, que arrancou do público aplausos de um
entusiasmo sincero.